Surgiu como produtora de biocombustível, mas cedo percebeu que o seu propósito deveria estar em resolver o problema de raiz. Por isso, desde 2011 a EGI dedica-se exclusivamente à recolha e valorização dos óleos alimentares usados, depois encaminhados para a indústria da produção de biodiesel.
Para conhecer a empresa fundada em 2008, falamos com uma das fundadoras, Sandra Vidrago.
Sandra Vidrago: Conhecida pela sua capacidade de inovação e de adaptação, a EGI foi fundada em 2008 com o propósito de produzir biocombustível e outros combustíveis verdes, apesar de todos os constrangimentos que existiam dado que a indústria estava apenas a dar os primeiros passos.
Em 2011, percebemos que o setor precisava de uma empresa que se dedicasse exclusivamente à necessidade primordial de recolha e triagem de óleos alimentares usados e, por isso, é a isso que nos dedicamos há uma década.
SV: Um dos aspetos que caracteriza o amadurecimento deste setor é o de que em 2011 o mercado nacional ainda não conseguia absorver a quantidade de óleo alimentar usado que era recolhido e encaminhado para a produção de biocombustível. Hoje, orgulhamo-nos de dizer que todo o óleo que triamos é utilizado por empresas portuguesas produtoras de biodiesel.
SV: Atualmente, recolhemos óleos alimentares usados (OAU) na rua, em grandes superfícies comerciais e em locais como juntas de freguesia, coletividades, bombeiros, condomínios, escolas, entre outros. Temos 600 oleões estrategicamente localizados, próximos de ecopontos com grande afluência, com capacidades unitárias variáveis. Estamos presentes nos municípios do Grande Porto, de Ovar, Marco de Canavezes, Vizela, Vale de Cambra, zona norte do país em parceria direta com a Sonae (Continente) e já em janeiro de 2022 com o município de Felgueiras. No próximo ano, esperamos alargar a nossa atuação até à zona de Coimbra.
Além dos pontos fixos, em parceria com a Maia ambiente, levamos a cabo a recolha porta-a-porta em compartimentos, no concelho da Maia, atualmente com 300 pontos de recolha.
A nossa ambição sempre foi alargar a nossa rede de oleões a mais pontos do país, contudo, este trabalho exige mais do que a instalação dos oleões, exige toda a logística que a recolha implica, como a gestão de rotas para aumentar a eficiência e a menor emissão de GEE possível, a limpeza dos pontos de recolha, entre outros. Assim, em 2022 a nossa ambição é chegar também ao canal Horeca.
SV: A recolha de óleos alimentares usados é regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 267/2009, que estabelece o regime jurídico da gestão de OAU produzidos pelos sectores industrial, hotelaria, restauração e no âmbito doméstico.
Este decreto-lei veio trazer normas referentes, por exemplo, à implementação de circuitos de recolha seletiva ou à rastreabilidade e quantificação de OAU. Neste sentido, já em 2009 se reforçava a necessidade de criar soluções para o sector doméstico, atribuindo um papel de relevo aos municípios e estabelecendo objetivos concretos para a constituição de redes municipais de recolha seletiva.
Contudo, o que temos visto é que ainda existe alguma inércia por parte dos órgãos de poder local para solucionar este problema. O nosso trabalho representa apenas 7% do total da quantidade de produção de OAU produzidos nos concelhos das regiões da Área Metropolitano do Porto (AMP) e Aveiro (AMA), onde a EGI atua. E se hoje recolhemos este volume de resíduos é porque existem parcerias da EGI com a Lipor, a Sonae e municípios que se associam para criar as sinergias necessárias. No caso do Grande Porto, os postos instalados nas grandes cidades da região são resultado de um contrato de concessão entre os municípios e a LIPOR e a EGI, que se associaram para instalar a maior parte destes oleões.
Por fim, diria que, por mais que exista vontade por parte das entidades privadas e dos municípios, em última instância, são os cidadãos aqueles com quem contamos para que se dirijam, de livre e espontânea vontade, aos oleões para depositar os seus óleos alimentares usados no local correto para que seja valorizado.
SV: De facto, o setor doméstico é aquele que carece de maior atenção pois é aquele em que, apesar de haver uma obrigação, não existem multas associadas ao incumprimento.
Consideramos como maiores obstáculos à gestão dos óleos alimentares usados pelas famílias, as eventuais questões de insalubridade associadas à incorreta deposição dos OAU nos oleões de rua, a falta de reconhecimento deste novo contentor, a resistência da população em armazenar temporariamente os OAU em casa, a falta de ações de sensibilização e de incentivos fiscais.
Além disso, nós que estamos no terreno sabemos que o investimento em pontos de recolha fixos requer custos que, sobretudo à microescala, podem inviabilizar o projeto do ponto de vista económico;
Tendo tudo isto em conta, o que temos feito para solucionar este problema, à nossa escala, é captar a atenção da sociedade para a problemática através de iniciativas em parceria com estabelecimentos comerciais, restaurantes, cafés e snack-bares, bem como com organismos públicos, incluindo autarquias (por exemplo o Concurso Eco-Óleo-EGI2013, na área da Lipor). Há uns anos, desenvolvemos, em conjunto com a Câmara Municipal de Aveiro na época do Natal, uma ação que consistia em colocar na fatura da água do município uma mensagem de sensibilização para a reutilização dos óleos utilizados nesta altura do ano.
Em 2022, esperamos voltar a poder interagir com as partes interessadas e focar-nos na sensibilização nas escolas.
SV: Há já muito tempo pensamos que deveria existir um cartão de cidadão ecológico. É injusto um cidadão que se preocupa com a reciclagem, não ser valorizado como tal. Devemos valorizar quem está preocupado com este tema. Através de um cartão poderia existir uma aproximação ao cidadão para promover a reciclagem do óleo alimentar usado e de outros materiais.
SV: Em 2020 recolhemos 274 toneladas e em 2021 cerca de 335 toneladas. O nosso dia-a-dia não passa só pela recolha de óleos alimentares usados, mas pela limpeza dos pontos de recolha, pelos serviços mensais que prestamos aos nossos parceiros, entre outros. O nosso trabalho é muito mais do que a simples recolha de resíduos.
Na parceria com a Maia ambiente, mais do que duplicámos a recolha de 6 para 15 toneladas, apenas nos compartimentos (casas do lixo –prédio – porta a porta).
SV: A maioria dos projetos de recolha e tratamento de OAU têm surgido através de parcerias ou financiadas pelos Programas da Comissão Europeia. Contudo, ao contrário do que seria de esperar, por norma, a maioria destas iniciativas surgiram apenas no âmbito da Mobilidade Sustentável ou no contexto de incentivos ao uso de Energias Renováveis e, só mais recentemente, no âmbito também da Gestão de Resíduos, implementados quer por Agências de Energia, quer por Câmaras Municipais e Juntas de Freguesia, quer, por vezes, até, por Sistema Municipais e Multimunicipais.
Contudo, de acordo com o artigo 8.º do Decreto-Lei 267/2009, até 31 de dezembro de 2015, tinham de ser disponibilizados, pelo menos: 80 pontos de recolha por cada município com mais de 300 000 habitantes; 60 pontos de recolha por cada por cada município com mais de 150 000 habitantes; 30 pontos de recolha por cada município com mais de 50 000 habitantes; 15 pontos de recolha por cada município com mais de 25 000 habitantes; 12 pontos de recolha por cada município com menos de 25 000 habitantes.
Existe, portanto, um mercado vasto de recolha de OAU por explorar em Portugal.
SV: O nosso caso de sucesso é termo-nos mantido no mercado desde 2008 com todas as dificuldades que encontrámos no caminho. Começámos como produtora de biocombustível e, rapidamente, percebemos que o nosso propósito passaria por resolver primeiro o problema da subvalorização do óleo alimentar usado como matéria-prima para a descarbonização.
No futuro, ambicionamos expandir a nossa rede de recolha para mais municípios e espaços comerciais, crescer no setor Horeca e alargar o nosso âmbito de recolha para mais tipos de resíduos.